A política sobre (ou anti) drogas adotada pelo Brasil está calcada em um discurso de intolerância, unidimensional e de exclusão, responsável pela criação de estereótipos humanos sobre os quais recaem medidas de normalização e controle. Essa política, presente no Brasil desde 1921, é consentânea às legislações sobre drogas adotadas no plano internacional, através de tratados e convenções. O discurso que a informa encontra ressonância na mídia, que por meio de mecanismos de persuasão, ligados à criação de um verdadeiro clima de guerra contra a droga e contra o traficante, conferem legitimidade ao discurso oficial. A associação do discurso oficial ao discurso midiático provoca a sedimentação do estereótipo criminoso, que passa a ser identificado como inimigo a ser destruído. Além disso, essa associação discursiva, por meio de procedimentos de exclusão e de limitação do discurso, não permite o florescer de discursos contrários ou refratários. Os portadores do discurso marginal ficam, portanto, alijados de voz, porque sobre eles há o estereótipo criado. Uma das mais importantes ferramentas de que se vale o Estado para aplicar o discurso oficial é o processo. No curso do processo, tem-se o encontro do indivíduo com o estereótipo que lhe foi criado pela política oficial e reafirmado pela mídia. Tem-se o encontro de representações sobre o tráfico. Apesar desse encontro, o discurso marginal, nem mesmo nos casos em que houve absolvição, não aparece, por força dos mesmos mecanismos de exclusão e limitação do discurso, em especial, em razão da desqualificação discursiva do indivíduo processado, sempre coletado das camadas mais baixas da sociedade. Tem-se o desencontro de representações sobre o tráfico. Resulta da pesquisa que a política criminal sobre drogas, tanto no Brasil como no plano internacional, foi erigida sobre um discurso dotado de eficientes mecanismos de manutenção. Mesmo quando esse discurso não se afirma concretamente, com a condenação de alguém acusado de tráfico ilícito de drogas, não se observa fissuras em sua estrutura. O indivíduo processado não procura infirmar o discurso predominante. Limita-se a buscar o “descolamento” de sua imagem à imagem estereotipada do traficante, contribuindo, ao final, com o fortalecimento desse estereótipo. Assim, se em princípio a absolvição criminal pode significar a ruptura do discurso oficial, fica demonstrado que, muito longe disso acontecer, a absolvição criminal representa a reafirmação deste discurso.
Referências para citação: CAIXETA. M.H.C. Drogas, Discursos e Mídia: Um diálogo sobre o (des) encontro de representações em processos judiciais. 2009. 102f. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Católica de Goiás, Goiás
Obs.: Material linkado com o Sistema de Publicação Eletrônica de Teses e Dissertações - Bilblioteca Digital PUC GOIÁS.